Ao fim do primeiro dia de audições na Assembleia da República, com vista a averiguar a gestão política e dos meios de proteção civil no combate aos incêndios que deflagraram na Madeira no passado mês de agosto, é já possível constatar que o secretário regional da Saúde e Proteção Civil “mentiu aos madeirenses” no que concerne ao número de bombeiros prontos a atuar e no que se refere ao ataque inicial ao fogo que deflagrou na freguesia da Serra de Água.
Quem o afirma é Miguel Iglésias, deputado do PS-Madeira à Assembleia da República, após terem sido ouvidos, em sede da 1.ª Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, o secretário-geral do Sindicato Nacional de Proteção Civil e o presidente da Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Proteção Civil.
Como adianta o parlamentar socialista, o secretário regional com a tutela da Proteção Civil, Pedro Ramos, “mentiu” quando disse que havia 750 bombeiros operacionais prontos para atuar, até porque, segundo o Sindicato Nacional da Proteção Civil, esse número porventura nem chegaria a 350, tendo sido possível constatar sempre o reduzido número de efetivos regionais no terreno até à chegada de reforços do Continente.
A isto acresce o facto de, atendendo ao histórico de incêndios da Madeira, aquilo que aconteceu não ser “imprevisível”, como foi confirmado pelo presidente da Associação Portuguesa de Técnicos de Segurança e Proteção Civil, que considerou que era possível outro planeamento dos meios, em particular no ataque inicial ao incêndio.
Miguel Iglésias evidenciou, aliás, o facto de o próprio Sindicato Nacional de Proteção Civil ter exigido a demissão dos responsáveis da Proteção Civil da Madeira, considerando “inadmissível” que, ao fim de uma semana, o incêndio continuasse ativo e se tivesse intensificado, criticando que o pedido de ajuda externa foi tardio e desorganizado, colocando em risco vidas humanas, património natural e a segurança de todos os madeirenses.
Os meios empenhados no combate às chamas e a recusa inicial de ajuda externa por parte do Governo Regional foram, aliás, algumas das questões colocadas por Miguel Iglésias, a par das contradições verificadas e das “declarações absolutamente inqualificáveis” de responsáveis políticos na Região, nomeadamente do presidente do Serviço Regional de Proteção Civil, de que não havia ameaça à floresta Laurissilva, que não eram necessários mais meios aéreos ou que não seria possível abastecer meios aéreos como os aviões Canadair na Madeira. “Ninguém compreende como é que logo no dia 15 de agosto não se pediu reforço dos meios aéreos”, condenou.
O deputado eleito pelo PS-Madeira deu também conta da preocupação com o facto de, como confirmado com provas fotográficas, várias cisternas onde o helicóptero de combate aos incêndios poderia abastecer de forma mais rápida, de modo a render mais o seu tempo operacional de voo, estarem destruídas, o que levou a uma diminuição do número de descargas.
Por outro lado, ainda que a ação dos meios aéreos por si só não seja suficiente, na sequência das audições desta tarde foi transmitido que o helicóptero ligeiro disponível na Região poderá não ser o mais adequado para estas situações, o que, revelou Miguel Iglésias, acaba por ser inquietante. “Nas próximas audições, não apenas com as entidades técnicas que vamos ouvir, mas também com a Autoridade Nacional de Proteção Civil e a ministra da Administração Interna, temos de compreender exatamente o que foi tratado entre os dois Governos e tutelas, de forma precisa e esclarecedora”, apontou.
O parlamentar socialista classificou ainda de “inacreditável” que o Governo Regional se tenha recusado a integrar o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais em 2020, não por pôr em causa a Autonomia regional, mas simplesmente porque não queria cumprir com as regras desse mesmo plano. “Isto é absolutamente inaceitável e incompreensível”, frisou.
Miguel Iglésias referiu-se ainda ao facto de o presidente do Governo, Miguel Albuquerque, ter considerado o combate aos incêndios na Madeira um sucesso. “É inacreditável a irresponsabilidade e a continuação em funções dos responsáveis da Proteção Civil regional”, rematou.